Qualidade do ar tem sido mais nociva aos moradores de Manaus, Manaquiri, Manacapuru, Iranduba, Careiro da Várzea e Careiro, conforme estudo feito por pesquisadores da Universidade do Estado do Mato Grosso (Unemat)
Os moradores de seis municípios do Amazonas são os que mais sofrem com a poluição do ar causada por queimadas e incêndios florestais, conforme um estudo feito por pesquisadores da Universidade do Estado do Mato Grosso (Unemat) e publicado na edição dessa sexta-feira (28) da revista “Cadernos de Saúde Pública”.
Os cientistas analisaram os dados de satélite do Centro Europeu de Previsões Meteorológicas a Médio Prazo entre 2010 e 2019 e concluíram que mais de 20 milhões de brasileiros moradores das regiões da Amazônia Legal e do Centro-Oeste do Brasil convivem por mais de seis meses ao ano com poluição do ar constante gerada por queimadas na Floresta Amazônica.
Um recorte mais profundo aponta que a qualidade do ar tem sido mais nociva para os moradores de dez municípios das regiões analisadas. E deste quantitativo, seis estão localizados no Amazonas. De acordo com o artigo, os municípios de Manaus, Manaquiri, Manacapuru, Iranduba, Careiro da Várzea e Careiro apresentaram o maior tempo de exposição à má qualidade do ar com níveis de 75% a 100% dos dias no período de agosto a outubro entre 2010 e 2019.
“O Estado do Amazonas chamou muito a atenção porque quando começamos a trabalhar com dados de dispersão de poluentes no Arco do Desmatamento, o desmatamento no Estado do Amazonas não estava tão intenso como nos últimos anos. A gente sempre teve municípios com piores condições de qualidade do ar no norte do Mato Grosso, no sudoeste do Pará e agora há um deslocamento dessa condição para municípios do Estado do Amazonas”, analisou uma das autoras do artigo e professora da Unemat, a epidemiologista Eliane Ignotti, ao A CRÍTICA.
“Quem não conhece o Amazonas, imagina que é um Estado cercado por floresta com boa qualidade do ar e não é isso o que está acontecendo”, apontou ainda.
Outro dado que surpreendeu a pesquisadora é a inclusão de Manaus como uma das capitais que mais foi exposta à poluição do ar nos últimos anos. “Chama a atenção o percentual de dias com má qualidade do ar na capital Manaus que é uma cidade grande, uma cidade industrializada, com outras fontes de emissão de poluentes para além dos poluentes emitidos pela queima de biomassa, pela queima de floresta”.
Poluição causada por queimadas
De acordo com os cientistas, o material particulado fino (PM2.5) é o principal poluente emitido pela fumaça dos incêndios florestais. Na prática, o estudo classifica a qualidade do ar de acordo com a Organização Mundial da Saúde, que determina que a concentração máxima aceitável desse material no ar é de 15 microgramas por metro cúbico em uma média diária. Acima disso, a concentração passa a ser de risco para a saúde humana.
“Por meio das médias diárias de exposição ao PM2,5 estimadas para todos os municípios dos estados da região Norte e Centro-Oeste, nós calculamos os percentuais de dias por mês, por ano e na década, cujos níveis do poluente estavam acima de 15 ?g/m3”, explicou Eliane Ignotti, que observa que as áreas mais afetadas apresentaram níveis altos de poluição.
“É interessante observar que muitas localidades, particularmente localizadas na área em que chamamos de ‘Arco do Desmatamento’, bem como na rota de dispersão dos poluentes, estes níveis elevados de poluição atingem 100% dos dias no período de estiagem”, complementou.
Participantes
Além da atuação da pesquisadora da Universidade do Estado do Mato Grosso, Eliane Ignotti, os pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso; da Fundação Oswaldo Cruz do Piauí e do Rio de Janeiro; da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e da Universidade de São Paulo (USP) também participaram do estudo.
Exposição à poluição causa várias doenças
Ainda segundo Eliane Ignotti, o estudo tem o objetivo de chamar a atenção da sociedades e entes públicos para a má qualidade do ar na área de maior biodiversidade do planeta, dado que inclui os biomas Amazônico, Cerrado e Pantanal. Ela destaca ainda que a exposição à poluição pode causar doenças respiratórias e cardiovasculares e gerar impacto no Sistema Único de Saúde (SUS) nas regiões afetadas.
“Imagine que milhares de internações e de óbitos poderiam ter sido evitado se os níveis de poluição não fosse os verificados nesta região. As pessoas não são expostas igualmente. Crianças, idosos, gestantes e as classes sociais mais desfavorecidas são os mais vulneráveis. O melhor cuidado é não se expor à poluição, particularmente com as atividades ao ar livre. Mas há indivíduos que não têm como evitar essa exposição em razão do trabalho. Por isso, as medidas de redução da poluição atmosférica devem ser tomadas pelos governos em conjunto com toda a sociedade”, disse ainda.
O próximo passo da equipe, de acordo com ela, é medir os impactos econômicos e sociais da elevada exposição da população brasileira à poluição do ar. “Nossa equipe de estudo tem se dedicado a estimar os custos ao sistema de saúde em razão de mortes prematuras para chamar a atenção dos gestores do campo da saúde, do meio ambiente e da sociedade”, finalizou ela.
Imagem: (Christian Braga/Greenpeace)
Agência Bori e Karol Rocha/karol.rocha@acritica.com