Torcedores do Boi Garantido revivem a tradição da fogueira acesa em noite de São João
Arte & Cultura
Publicado em 25/06/2024

A tradicional Ladainha traz a saída do boi vermelho e branco pelas ruas da Baixa do São José, em cumprimento a uma promessa feita por Lindolfo Monteverde para alcançar a cura de uma doença

 

Parintins (AM) - A centenária promessa de Lindolfo Monteverde segue sendo cumprida, com o Boi-Bumbá Garantido ganhando as ruas de Parintins nesta segunda-feira, dia 24 de junho, dia de São João. 111 anos depois, o que pode-se dizer é que esta promessa – que começa com a tradicional Ladainha – deixou de ser apenas dele, e está presente na vida e imaginário de milhares de parintinenses, que acendem uma fogueira em frente às suas casas esperando a chegada do boi.

 

Uma dessas pessoas é a manicure Lilian Reis, que junto da família – toda perreché – acende uma fogueira em homenagem ao Boi e também a sua avó, matriarca da família que trouxe para eles tal tradição. Para ela, este momento transpassa a promessa, sendo mais uma prova do amor existente na relação do povo e o Boi da Baixa do São José.

 

“A gente faz a fogueira desde o tempo da minha vó, que nos mostrou o Garantido, esse amor. E desde que ela se foi, a gente continua, por amor ao Garantido e em memória dela. Só quem é parintinense sabe o que é o amor pelo boi, de ter certeza que ele faz parte do nosso coração. O Garantido é a personificação do amor”, afirmou Lilian.

 

Família Reis, que mantém a tradição de acender a fogueira desde a morte da matriarca da família (Daniel Brandão)

 

A promessa centenária também perpassa a vida da senhora Cacilda Tavares Ribeiro, que aos 85 anos se mantém em pé à espera do amado boi de pano. Tal relação se ramificou, saindo dela para o restante da família, que acompanha a cada Ladainha.

 

“O Garantido pra mim é o amor, é o que me faz acender essa fogueira há mais de 20 anos e ser Garantido desde criança. É um momento de unir a família em volta dessa fogueira, desse amor”, disse a idosa.

 

Memória viva

No meio de tantas fogueiras e declarações de amor ao Boi Garantido, o comum é encontrar em meio às ruas de Parintins perrechés que mantém a tradição criada por um familiar mais novo. No entanto, este não é o caso de Rosa Aliete da Silva, que aos 73 anos largou tudo para continuar com o ato de amor realizado anualmente pela filha, Ana Rosa, desde 2008.

 

Ana morreu em 2018, vítima de lupus, e coube à mãe, que morava em Manaus, vir morar em Parintins para seguir com a fogueira e doação de comida anual a cada Ladainha do Garantido. O ato serve como forma de mostrar o amor pelo bumbá, mas também de perpetuar a memória da amada filha.

 

Rosa Aliete da Silva, que mantém a tradicional festa feita pela filha, que morreu de lupus em 2018 (Daniel Brandão)

 

“Foi eu que a tornei Garantido, porque eu sou desde criança. Quando perdi ela, resolvi largar tudo para manter essa tradição. É um amor que ela tinha, que eu tenho e que vai se perpetuar, porque vai seguir com quem vem depois. Esse amor, por ela, pelo Garantido, não acaba, permanece sempre”, ressalta Rosa.

 

Tais atos são o que tornam o Garantido o ‘Boi do Povão’, afirmam Karina Nascimento e Thiago Tavares, manauaras que acompanham a ladainha e o boi nas ruas neste ano. Segundo eles, a relação do bumbá com seus torcedores transpassa os limites do Bumbódromo.

 

“A gente sempre fala de Garantido na arena, no Bumbódromo, aquela coisa grandiosa, que é linda. Mas o Garantido, em sua essência, está aqui, na rua, no chão, brincando com o seu povo. Isso é tradição, é família, galera. é algo único”, disse a assessora Karina Nascimento.

 

Tradição perpétua

 

Maria Monteverde, filha do fundador do Boi Garantido, Lindolfo Monteverde (Daniel Brandão)

 

Sangue e herança de Lindolfo Monteverde, a senhora Maria do Carmo Monteverde se emociona mais uma vez ao ver, ao fim da Ladainha, que uma multidão segue o Boi criado por seu pai, sob inspiração de Deus – segundo ela.

 

“O Garantido é a minha vida, porque eu já passei tanta dificuldade na vida, mas com ele, com essa cultura que meu pai fez crescer ao ganhar das mãos do Senhor, sempre me deixou feliz. Nossa cultura está no mundo todo, e a nossa cultura não tem igual”, afirma a filha de Lindolfo.

 

Presente durante a Ladainha, o atual presidente do Boi Garantido, Fred Góes, afirma que a Ladainha e a saída do boi no São João são a perpetuação do desejo do criador do bumbá.

 

“Isso aqui é a manutenção da memória. Somos todos passageiros, mas a história, esse legado vai permanecer, o Garantido vai permanecer, é eterno. Esses momentos, essas memórias, nos fazem reviver o passado, para que não cometermos os mesmos erros de antes. Isso é a manutenção da alegria do seu Lindolfo, ele queria que isso se perpetuasse”, enfatiza Fred.

 

Fred Góes, presidente do Boi Garantido (Daniel Brandão)

 

A Ladainha do Boi Garantido é uma tradição do bumbá vermelho e branco que atende a uma promessa feita pelo seu fundador, Lindolfo Monteverde, há mais de 80 anos, a São João, padroeiro dos doentes. O fundador prometeu colocar o boi nas ruas para brincar ao redor de uma fogueira, em pleno dia de São João, caso se curasse de uma doença. Com o desejo atendido, a tradição se renova ano após ano, com a manutenção dos torcedores do touro branco.

 

Nessa data, boi brinca ao redor da fogueira na Baixa do São José (Daniel Brandão)

 

Boi Garantido recebe afagos dos torcedores do bumbá (Daniel Brandão)

Por: Michael Douglas / online@acritica.com

 

 

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