Grupo determina nutrientes ideais na dieta do tambaqui, o que pode baixar o custo da ração
Publicado em 19/05/2025 09:18
Economia

Experimento conduzido na Unesp de Dracena mostrou que a espécie consegue usar carboidratos como fonte de energia, tornando possível reduzir o teor de proteínas – que têm valor mais elevado – na alimentação dos peixes. Tal medida também diminui a excreção de compostos nitrogenados e o impacto ambiental da piscicultura intensiva

 

Estudo conduzido no campus de Dracena da Universidade Estadual Paulista (Unesp) demonstrou que juvenis de tambaqui (Colossoma macropomum) conseguem utilizar carboidratos como fonte de energia, poupando o uso de proteína – o ingrediente mais caro das rações para peixes.

 

Os resultados, publicados no Journal of Animal Physiology and Animal Nutrition, indicam que a formulação ideal para aliar desempenho zootécnico e metabolismo animal de forma mais sustentável é a dieta com 260 gramas por quilo (g/kg) de proteína digestível e 180 g/kg de amido.

 

O estudo faz parte de um projeto apoiado pela FAPESP e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam). É coordenado por Leonardo Takahashi, professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Tecnológicas (FCAT-Unesp), e envolve pesquisadores do Centro de Aquicultura (Caunesp). O grupo avaliou seis dietas formuladas com diferentes proporções de proteína e carboidrato.

 

“A nutrição é um dos principais desafios na produção de peixes, pois a alimentação corresponde a mais de 70% dos gastos totais e a proteína é um fator que encarece muito a ração”, explica Gabriela Carli, primeira autora do artigo, que realizou a pesquisa durante seu mestrado no Programa de Pós-Graduação em Aquicultura do Caunesp.

 

Além da aplicação direta na formulação de rações, o estudo contribui para desfazer a ideia, ainda presente em parte da literatura, de que peixes são intolerantes ao carboidrato. “Muitos dos estudos clássicos foram feitos com peixes de clima temperado, como salmões e trutas. Mas os nossos peixes nativos, como o tambaqui, têm um metabolismo diferente e precisam ser estudados com base em sua ecologia e dieta natural”, explica Takahashi.

 

O tambaqui é um peixe da região amazônica que se alimenta de frutos e sementes que caem na beira do rio, além de outros organismos vivos menores, por isso é considerado onívoro. “Isso sugere que a espécie possui mecanismos fisiológicos para a utilização de alimentos ricos em carboidratos”, considera Takahashi.

 

Em trabalho anterior (2022), os cientistas avaliaram a resposta metabólica do tambaqui à glicose e à frutose. Os resultados mostraram que o tambaqui aproveita de forma eficiente a glicose e frutose presentes em sua dieta na natureza. “Com isso, vimos que o tambaqui é metabolicamente bem adaptado ao consumo de carboidratos, o que nos deu base para pensar numa formulação com maior teor de amido”, comenta Takahashi. “Esse estudo foi essencial para entender o funcionamento bioquímico do tambaqui e definir uma dieta mais eficiente no novo trabalho”, completa o pesquisador.

 

Efeito poupador de proteína

“Nós trabalhamos com a hipótese de que o tambaqui, sendo um peixe onívoro da bacia amazônica, naturalmente exposto a frutos e sementes, teria um metabolismo capaz de aproveitar bem os carboidratos como fonte de energia”, explica Takahashi. “Ao confirmarmos isso, conseguimos formular uma dieta com menos proteína e mais carboidrato, sem prejuízo ao desempenho zootécnico”, relata.

 

O conceito de “efeito poupador de proteína” busca justamente substituir parte da proteína utilizada como fonte de energia por fontes mais baratas, como carboidratos ou lipídios. Com isso, a proteína passa a ser usada prioritariamente para o crescimento dos peixes – sua principal função biológica – e não como combustível energético.

 

As dietas testadas foram formuladas de forma isoenergética, ou seja, com a mesma quantidade de energia digestível, respeitando as exigências nutricionais conhecidas para o tambaqui. Foram combinados três níveis de proteína digestível (230, 260 e 290 gramas por quilograma) e dois níveis de amido (180 e 280 gramas por quilograma), totalizando seis dietas experimentais. A formulação teve como referência os parâmetros estabelecidos por estudos anteriores. As fontes proteicas incluíram farelo de soja, farinha de peixe e glúten de milho; o amido de milho foi utilizado como principal fonte de carboidrato, e, o óleo de soja, como fonte lipídica.

 

“Os ingredientes proteicos são os que têm maior impacto no custo da ração”, afirma Takahashi. “Se o peixe for capaz de usar carboidrato como fonte de energia, conseguimos reduzir a inclusão de proteína, baratear a dieta e, ao mesmo tempo, minimizar a excreção de compostos nitrogenados, como a amônia, que são tóxicos e prejudiciais tanto ao peixe quanto ao ambiente”, comenta o pesquisador.

 

A excreção de amônia é uma preocupação importante na piscicultura intensiva, pois seu acúmulo pode comprometer a qualidade da água e provocar mortalidade nos viveiros. A menor presença de resíduos nitrogenados, associada ao uso eficiente de nutrientes, contribui para tornar a produção mais sustentável.

 

O estudo também abre caminho para o uso de ingredientes locais, especialmente na região Norte, onde a produção de tambaqui é concentrada, mas os custos com ração são elevados devido à necessidade de transporte de insumos vindos do Sul e Centro-Oeste. “A continuação desse trabalho é justamente testar ingredientes vegetais disponíveis regionalmente, como resíduos de indústrias de polpa de frutas da Amazônia”, adianta Takahashi.

 

Carli reforça a importância prática da pesquisa: “A ração representa mais de 70% do custo de produção do peixe. Reduzir esse valor sem comprometer o crescimento do animal tem impacto direto para os produtores, especialmente os de menor escala, que muitas vezes enfrentam dificuldades para adquirir ração adequada”.

 

A pesquisa foi realizada com juvenis, fase em que o peixe apresenta maior exigência nutricional e o custo da alimentação é mais elevado. “Essa fase permite também maior controle experimental e reflete uma etapa crítica do ciclo produtivo”, acrescenta Takahashi.

 

O artigo The Protein/Carbohydrate Ratio in the Diet Affects Zootechnical Performance and the Regulation of Intermediary Metabolism in Juveniles Tambaqui (Colossoma macropomum) pode ser lido em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/jpn.14060.

 

* Com informações da Assessoria de Comunicação do Programa de Pós-Graduação em Aquicultura da Unesp Jaboticabal.

 

(Foto: Agência Brasil)

Agência FAPESP

 

 

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